quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Desabafo

Poucos livros mexeram tanto comigo quanto o Outras Ondas, do colunista da Fluir Fred D`Orey.
O mais incrível é que o livro é basicamente uma compilação das colunas escritas por ele ao longo dos anos, as quais no mínimo 30% eu já havia lido nas páginas da Fluir.
O fato delas estarem ali, enfileiradas, surtiram o efeito de um tapa na nuca atrás do outro, me fazendo acordar e repensar a minha vida.

Eu amo o surf, desde pequeno sempre sonhei em fazer dele a minha vida, e por que diabos, eu, com 23 anos ainda não estou vivendo dele?!
Sou aquele cara classe média, citado pelo Fred numa das colunas, o qual, se desprovido de um talento descomunal, melhor seria desistir dessa idéia de surf profissional.
Mas peraí, eu não falei em ser surfista profissional, não tenho talento pra isso, só de paixão o cara não vira um Curren.
Falei em viver do surf, e isso sim eu ainda tenho a possibilidade de fazer.

Moro em Porto Alegre, cidade com maior número de surfistas do Brasil, guardadas as proporções com seu número de habitantes.
E se aqui tivesse onda, o crowd seria insuportável.
Tenho que dirigir no mínimo 1:30h pra surfar as piores ondas do Brasil.

E se o Brasil é um lixo em matéria de ondas, o RS é um aterro.
Parece que Deus se cansou de desenhar o litoral brasileiro em Torres e traçou uma linha reta até o Chuí.
Não tem um morro sequer pra proteger dos ventos, a água é marrom, suja e o crowd é bizarro próximo as plataformas de pesca, onde os fundos de areia ficam um pouco menos piores.

E porque diabos eu amo tanto esse tal de Surf?!
Sei lá, fui fisgado, virei prisioneiro.
A cada feriado rola uma discussão com a minha namorada, serra ou litoral?
Gramado ou Santa Catarina? Vou pro Surf é lógico, com ou sem ela.
Depois de uma dessas discussões, mostrei pra ela o texto Prisioneiro do surf.
Depois de ler, ela virou pra mim com os olhinhos marejados, e disse:
Tu é mesmo um prisioneiro?
O silêncio foi a única resposta que eu pude dar.
Continuamos juntos, e o surf segue ganhando, tadinha.

Já tive sim, contato com mercado do surf.
Quando mais novo, o meu primeiro trabalho foi como webmaster de um site de surf.
Fazia a função de catar matérias na internet e reescrevê-las para o site, ou simplesmente colá-las lá com os devidos créditos.
Além de atualizar as condições da prática no litoral gaúcho enviadas por um correspondente da praia de Tramandaí.
Era um trabalhinho humilde, ganhava uma merreca, mas o fato de eu estar “trabalhando para o surf” fazia a minha cabeça.

Em seguida entrei para a publicidade.
Nessas alturas eu já cursava Design Gráfico, e fazia alguns freelas pra uma pequena surfshop do meu bairro.
Um brother meu que trabalhava como gerente de marketing dessa lojinha e estudava PP me intimou e montamos uma Agência/dupla de criação.
Começamos atendendo essa lojinha, nosso primeiro cliente.

Foi uma experiência do caralho, começamos no peitáço e em questão de 3 anos, já tínhamos saído do sótão da minha casa pra uma sala de dois ambientes com mais um sócio, 4 funcionários e 2 contas nacionais. Uma delas a OGIO, gigante das mochilas.
Nessa época tive a oportunidade de conhecer o ramo editorial, e participei da diagramação de parte da revista Solto, e da íntegra da Solto Colegial.
Descobri uma paixão, a diagramação e o projeto gráfico de revistas.

Mas, como na vida de todo miserável surfista, o surf sempre fala mais alto.
E eu precisava sair dali, já tinha crescido, já tinha maturidade suficiente pra viajar sozinho há tempos, e aquelas porcarias de ondas já estavam me dando nos nervos.

Fiz a mala, e me mandei pra Califórnia.
Morei por 5 meses em Santa Bárbara, surfava Ventura quase que diariamente e Rincon sempre que rolava.
Viajei praticamente todo o litoral, de San Diego a San Francisco. Inúmeras ondas.
Black`s, Sunset Cliffs, Windansea, Trestles, Ventura, The Cove, Rincon, Little Rincon, Jalama, Tarântulas, Huntington, Newport, Carmel, Steamers Lane.
E pra finalizar a trip da minha vida, por U$367.00 ida/volta, Hawaii.
UM SONHO. E eu vivi isso. Valeu pai.

Mas, como eu nasci brasileiro, a minha realidade é aqui, e estava na hora de voltar, fazer a minha vida, pra depois sim, poder passar por isso as minhas custas, nos curtos períodos de tempo em que meu trabalho permitir.
Voltei, de cabeça pra publicidade.

Hoje em dia trabalho na DCS, conceituadíssima agência de publicidade Porto Alegrense.
É um certo status, e tem gente que enche a boca pra dizer que trabalha aqui, mesmo sendo aquele estagiário que qualquer D.A. júnior caga na cabeça.
E foi aqui mesmo, questão de duas semanas atrás que caiu na minha mão o livro do D`orey que, como eu falei no começo desse texto me fez repensar a minha vida.
Eu amo o surf, desde pequeno sempre sonhei em fazer dele a minha vida, e por que diabos, eu, com 23 anos ainda não estou vivendo dele?!

Trabalhar em agência é legal, o ambiente é descontraído, as pessoas são descoladas, inteligentes e tem bom gosto.
Mas cadê o surf?! Quê que eu to fazendo aqui?
Eu gosto do Design Gráfico, mas eu amo é o Surf, e dentro de agência não tem surf.
Onde é que eu vou conseguir unir os dois?!

Se alguém souber, me avisa por favor.

Um comentário:

  1. Como eu, de certa forma, fui citado neste seu posttextoautobibliografia-ouhistóriapraboidormir, me senti na obrigação de fazer um comentário: Quê que vc, um cara de 23 anos de idade, que sempre sonhou viver do surf não vai lá e tenta isso de verdade? Eu faço parte de boa parte desta sua história e posso afirmar que só existe uma coisa que você (sim, esse cara aí de 23 anos de idade bla bla bla)jamais deu cachorro, esqueceu, deixou pra lá e coisas do gênero: o surf. Sempre foi prioridade.

    Então velinho, segue nessa "gana" que uma hora você vai chegar lá!

    Samuca.

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